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Ivana Ferrante Rebello
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Por Ivana Ferrante Rebello - 12/8/2022 14:01:39 |
abre alas, que os catops, marujos e caboclinhos vm chegando! Em agosto, a velha cidade acorda. Montes Claros, avozinha, enfeita-se toda mocinha, com fitas, cores e estandartes. Sopra um vento norte, que entra pela frincha das portas, invade a quietude das salas e se esgueira pelos cantos das casas, acariciando a alma da gente. Em agosto, ms festeiro, pouco a pouco, abrem-se as janelas, debulham-se os teros, varrem-se os terreiros, como se tudo se preparasse em ritmos e pausas. Em agosto, os cheiros tambm se preparam em fornadas de biscoitos, cachaa da boa, carne de sol de dois pelos, fritando nos braseiros. Em agosto, alguma coisa sagrada se prepara e se anuncia. Quem vem chegando, no pede licena; ocupam as ruas, dobram as esquinas, acordam as lembranas, escrevem histrias. Quem vem chegando, com vento, festa e alegria, traz um canto longnquo, entoado antes de mim, antes de meus avs, antes mesmo das casas dos homens que aqui ficaram. Um canto de frica e das naus portuguesas e um canto dos povos que aqui habitavam. Quem vem chegando, quem vem de l? Os catops, os marujos e os caboclinhos. Eles vm festejar o Divino, So Benedito e Nossa Senhora do Rosrio. E trazem os sons das irmandades pretas, as cores das pajelanas e as naus dos europeus na rica mistura dos povos que nos habitam. Antes deles, as pedras da cidade pulsam, como que anunciando. E nossos coraes pressentem. Caixas, tamborins e pandeiros esto chegando. A mo preta que dita o como da festa convida e atia. H uma energia ancestral que dana na rua, brinca com os santos, ergue os mastros, sada os antes. H uma histria sendo desfiada em todo p que desfila, em todo menino que a, em cada mulher que se enfeita. Em agosto, h cortejos, reinados, brancos, pretos e indgenas, ritmo, msica e adorao. Em agosto, a histria da formao do povo brasileiro encenada nas ruas de Montes Claros, na celebrao dos diferentes povos que forjaram nossa alma mestia, nossos vrios falares. Em agosto, a nossa identidade se revela, em os brincantes, batuques e cantorias. Os mastros encenam nossa f brasileira - mestia, sincrtica e feliz manifestao do povo que nos habita. Em agosto, tudo se prepara, tudo se realiza e tudo performance de uma histria que no pode ser esquecida. Todos sabem, todos cantam, ningum esconde do outro que, em agosto, na verdade, Montes Claros mostra sua verdadeira alma. Ivana Ferrante Rebello Presidente da Academia Montes-clarense de Letras (Esse texto dedicado ao Mestre Zanza. Aos catops, marujos e caboclinhos. E querida Felicidade Tupinamb) |